quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

SOBRE A SÍNDROME DO NINHO VAZIO


Outro dia presenciei o momento de desespero de um sábia, quando pousou e não encontrou mais os filhotes. Com o bico cheio, tal mãe com os peitos repletos, voou para lá e para cá, como quem perde o juízo. Assim, esquecidas de si, ficam todas as mães quando desaparecem os filhos nessa vida louca!...
Perda implica em ausência, sumiço do bem querer, mesmo que não seja para sempre, mas que nos faz solitários.
Quando iniciamos uma família, o primogênito ganha o título nobre de príncipe ou princesa, não é uma questão de classe social: todos nós assim nos comportamos. Com o tempo, logo vêm os irmãos, filhos de iguais títulos. E não importa quantos deles tenhamos. Num certo dia, num desses dias que chegam para os pais que amam – pois para os que não amam jamais chegam – a casa amanhece num silêncio perturbador, sem seus gritos ou o som de suas quedas e o de objetos que eles mudam de lugar e de forma! Então passamos a ouvir o barulho de fantasmas no piso que estala, na janela que não foi devidamente fechada, do vento no telhado, da conversa do vizinho e, se temos um cachorro, do uivo lamuriento dele. Assim sentimos quando saem os filhos, um a um, para estudar longe e, quando adultos, dividem entre as famílias constituídas, o Natal e o Ano Novo. É justo, justíssimo! Mas somos chorões demais e nunca nos preparamos. Compreendemos. Mas sofremos. Fazer o quê, se somos sabiás com os bicos cheios? Então é chorar mesmo, voar, derramar nossas lágrimas em dois pequenos cálices, tentar ignorar a saudade, brindar à alegria deles, (pois é nossa), e, num gole só, no xis dos nossos antebraços, agradecermos a Deus por ainda os termos.
A propósito, você está cada vez mais linda, Fátima. Os fogos e o estouro de champanhe que ouvimos agora ao longe, são para nós dois também! Feliz Ano novo! Feliz Ano Novo para todos!


31.12.2008
João Marni de Figueiredo

DO PECADOR PARA O SANTO




Como é complexa, diversificada e única, a imprevisível personalidade do gênero humano! Na busca da felicidade no horizonte perdido de cada um, há os que se socorrem do próprio isolamento a meditar; há aqueles que pensam consegui-la apenas se fizer fortuna; os altruístas e empáticos parecem tê-la; os caridosos e humildes como São Francisco, tudo indica possuí-la; os que se dedicam ao conhecimento (seja da matéria ou da alma), asseguram que é possível obtê-la. Há quem a veja numa rosa, num dia chuvoso no Nordeste do Brasil, num dia de sol na sombria Londres, na reconciliação do amor ou ao final de mais uma guerra. Mas os dias do hoje escondem este sentimento de tal modo que o sonho de ser feliz, direito de todos, torna-se cada vez mais utópico, razão pela qual se explique em parte o uso indiscriminado de drogas, inclusive, de forma alarmante, entre os muito jovens. Observamos corriqueiramente garotos e garotas de pouca idade para qualquer coisa que não seja dar recado ou brincar de boneca, em festinhas de “som de bate estaca”, desacompanhados de um anjo adulto da família, a tomar porres de variações do álcool, com conseqüências imprevisíveis.
Temos um neto de quase 14 anos, “BBB” (Breno, Bom e Bonito) e o monitoramos de perto sempre que podemos. Nossas conversas são francas e abertas, para que esse monitoramento não exija nossa presença física ostensivamente, na tentativa de contribuir na organização de um superego razoável e sensato, que nos liberte de tanta preocupação.
Orientá-lo para que não ceda à força do grupo de sua idade em assuntos “perigosos” é uma tarefa do dia a dia, já que eles, nessa fase, imitam instintivamente e querem emoções novas que os levem logo à vida adulta, lugar em que julgam coexistirem irmanadas, liberdade e felicidade. Sobre a ilusão de encontrar alegria e auto-confiaça com ajuda de bebida alcoólica ou de outras drogas ditas mais conflitantes, disse-lhe que é a saída dos fúteis e pouco inteligentes, e que cada indivíduo reage diferentemente a elas, pois todos nós carregamos na mente os animais com os quais nos identificamos:
- Alguns liberam pássaros (ficam cantantes, sinfônicos, até);
- Outros deixam sair cães tipo poodles ou labradores (só diversão)
- Há os que soltam lagartixas e lagartos (palavras vãs, palavrões);
- Há aqueles que se livram de macacos (e haja palhaçada) ou de porcos (quando então perdem o estilo);
- Infelizmente existem os que também nos brindam com cascavéis e pittbuls (e aí é pura dinamite: quando não matam, machucam demais);
Mas se você liberasse apenas pombas brancas, daquelas da Paz de Jesus após tomar vinho com seus amigos apóstolos, então prometo acompanhá-lo em suas “bicadas”! O ideal é não iniciar, pois todos esses bichos podem pertencer a um só indivíduo, que os vai soltando um a um em dias incertos, seguindo ou não a ordem que citei.
Procure, meu neto, a felicidade no coração de quem de fato queira o seu bem.
Com certeza ela lá se encontra se você acreditar. Afinal, nenhum de nós que amamos a você, deseja-lhe a outra face dessa utopia.


Um beijo do seu Vozinho.
Feliz Ano Novo!

31.12.2008
Dr. João Marni de Figueiredo.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

AMOR VIRTUAL


De tanto ouvir sobre tragédias nos noticiários, fruto de encontros ora do acaso, ora de forma premeditada, envolvendo pessoas inocentes e bandidos, refleti que isso sempre ocorreu, sabe-se lá desde quando; hoje certamente em maior escala e riscos.

A tecnologia vem contribuindo, seja pelo telefone celular ou pelo computador, para esses contatos entre pessoas, muitas vezes envolvendo crianças, e também casais virtuais, sem que os personagens troquem olhares ou sintam o perfume do outro, - dirá o ferormônio, deixando de lado a visão de um certo jeito de andar... Ai veio-me a lembrança de tempos não tão distantes, da prática interiorana na busca pela cara-metade reservada nos altares de Deus, dos sonhos de cada um. Os encontros aconteciam também em qualquer lugar mas, muito freqüentemente, nas praças. A Siqueira campos, aos domingos à noite, era o grande palco onde as garotas passeavam num rito austero e delicado, nunca sozinhas, mas em pequenos grupos, de braços, limpas e cheirosas, em seus vestidos bonitos e pouco insinuantes, repetidos com choro e não menos espetaculares. Desfilavam contornando a praça para uma platéia de marmanjos que ficava à margem, aparentemente alheias a eles em seus segredos. Vez ou outra os olhares se cruzavam furtivamente, deixando alguma dúvida que só seria revelada no giro seguinte.

Confirmado pelo olho no olho, o coração dispara e as pernas – pelo menos as minhas, fraquejavam diante da próxima etapa do passeio, quando lá vem a todo-poderosa, e o homem deixa de ser menino, dirigindo-se à pretendida sem medo de uma “rabissaca”, ou de um “corte”, roubando-a de seu grupo e convidando-a a sentar-se em um dos bancos, no centro daquele carrossel de ilusões, de encanto, de paixões e de decepções... Ainda ouço os risos e os incentivos dos amigos que continuavam a tentar a sorte...
Dali, relações afetuosas se formavam e vingavam, como foram as do meu pai e da minha mãe, e de muitos outros que, como eu, são românticos e nostálgicos e só acreditamos, a exemplo de São Tomé, após termos visto,tocando e cheirado! Talvez a única vantagem de agora é que os pais não precisam mais entrar em casa na ponta dos pés a fim de surpreenderem o namoro dos filhos ou dos netos, pois através da telinha do computador não se escutam as juras de amor, mas apenas o barulho discreto do teclado tocado por mãos que não afagam, transmitindo mensagens ditas por bocas mudas que não beijam, olhos que não vêem e corações que apenas batem mas provavelmente não sentem. Seus aposentos trancados têm um cheiro azedo de suor, chulé e mofo, por proibirem o sol de lá entrar e iluminar-lhes as mentes modernas. À noite, semanalmente, sedentos iguais NOSFERATUS, encontram-se em baladas, num ritual de ficar por alguns instantes, revezando-se num pescoço marmóreo e exaurido, e retornam sem paixão, sem afeto e sem norte.
Tantas modas voltam, mas, infelizmente, tenho a impressão que as praças não têm mais pistas apropriadas para o flerte (expressão caduca e estranha), mas para corridas ou caminhadas cronometradas , silenciosas, individualizadas, daqueles que visam melhorar a condição física pelo culto ao corpo, a despeito de haver ali alguém solitário que ainda hoje arrisca um olhar a partir do circulo externo... Ou será que a vida é que está sempre indo e nós é que, de fato, ficamos?
Crato, CE, 10/12/08.
Dr. João Marni de Figueiredo.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

A PRIMEIRA PEDRA

... E Narciso quebrou o espelho d água jogando, no fundo lamacento do lago, não apenas sua imagem, mas o respeito na vida a que teriam direito seus familiares, agora reféns da platéia circense de todo globo. Com seu gesto impensado, condenou a todos direta ou indiretamente envolvidos, a procurar em vão uma sombra onde ficar, em meio a um deserto de solidariedade e de compaixão. Não há onde se esconder e não há também água que alivie sua sede e sofrimento, apenas pedras arremessadas e fel na ponta da lança...

Começam a lamber as próprias feridas até os inocentes, por gerações seguidas, com o estigma daquilo que deveria ter ficado entre quatro paredes. Essas pessoas, em busca de ajuda e sem ter a quem recorrer, até parecem repetir incessantemente os versos da poetisa goiana Cora Coralina: “Bati na porta de um coração. /Bati, Bati. Nada escutei. / Casa vazia. Porta fechada, foi o que encontrei.”

É, parece que os amigos andam muito ocupados, fecharam suas vitrinas em que se minguaram o pão e o ungüento. A repercussão tem o tamanho do poder de quem erra e não do ato em si, pois duvidamos se seria grande, caso os envolvidos tivessem sido Chico Bento, Severina e Raimunda. Personagens existem entre nós desde escândalos cometidos em nome da fé, a políticos que se elegem e se reelegem com a pouca memória popular, impedindo terem uma vida melhor e mais justa, crianças e idosos.

É evidente que os protagonistas das cenas que ganharam o mundo saindo daqui, ruborizariam até Federico Fellini, (“La Dolce Vita” – 1960) e Gerard Damiano (“Deep Throat” – 1972), cineastas da sexualidade e do comportamento não convencionais.

Mas há inocentes nas famílias que precisam dormir em paz. Que não façamos mais barulho. Só para encerrar o que já é tão desgastante, fiquemos com as palavras de Steve Jobs, fundador da poderosa empresa APPLE, por ocasião de uma formatura da qual foi patrono: “O tempo de vocês está marcado; não o desperdicem vivendo a vida alheia”!

Pois bem, é provável que o céu já esteja modernizado, e os julgamentos ocorram agora “ON LINE!”!

Crato, CE, 04/02/09.
Dr. João Marni de Figueiredo
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